Petrobrás, outra vez...

O que está acontecendo com a Petrobrás ???

Falha humana, negligência, despreparo. A Petrobrás é reincidente no derramamento de óleo, nos graves danos ambientais e no discurso da "fatalidade". Mudou apenas de endereço: a Baía de Guanabara ainda nem se restabeleceu do vazamento de 1,3 milhão de litros de óleo, em janeiro, e o Paraná já amarga um desastre ainda maior, com 4 milhões de litros de óleo bruto espalhados pelos rios Barigüi e Iguaçú.

As semelhanças entre os dois casos levantam suspeitas de sabotagem: é incompetência demais deixar vazar milhões de litros de óleo de um oleoduto, sem perceber, durante horas, que a pressão mudou, que um lago negro está se formando, sem um alarme para tocar, nem um funcionário para acompanhar o bombeamento. E no caso de Araucária, o que é ainda mais grave, o vazamento se deu dentro da refinaria!

As suspeitas de sabotagem foram negadas pelo presidente da Petrobrás, Henri Phillipe Reischtul, logo na primeira entrevista sobre o acidente de Araucária, na segunda feira, dia 17 de julho. Mas ainda é uma das hipóteses em discussão via Internet, um meio onde pesquisadores, ambientalistas e juristas expressam seus temores e convicções com menos censura. O objetivo da sabotagem, cogita-se, seria preparar a venda da Petrobrás para as grandes multinacionais do setor petroleiro, mais "boazinhas" do ponto de vista ambiental.

Fundamentada ou não, a hipótese de sabotagem não ameniza a indignação pelo descaso com que a empresa trata o meio ambiente. Depois do acidente da Baía de Guanabara, o mínimo que se poderia esperar seria uma revisão profunda dos procedimentos de segurança, alardeados, no site da Petrobrás como "de excelência".

Ou a revisão não aconteceu, ou não produziu resultados. Por isso, é preciso repensar a situação da empresa diante dos órgãos ambientais e da opinião pública, à qual a Petrobrás busca passar uma imagem de "vanguarda mundial das empresas que respeitam o meio ambiente, confirmando seu compromisso com a qualidade de vida e com o bem-estar das pessoas".

Desde o acidente de janeiro, o ministro do Meio Ambiente, MMA, José Sarney Filho, mandou rever todos os licenciamentos ambientais concedidos a refinarias e oleodutos. Deveríamos acrescentar à lista do ministro os certificados e prêmios ambientais atribuídos à Petrobrás.

Como pode uma empresa desse porte, com tal potencial de produzir "fatalidades", ostentar um certificado ISO 14001 por sua "excelente" gestão ambiental? Ou o Prêmio Empresa Preservacionista do Ano (1996)? Está certo que os certificados e prêmios, assim como as licenças, foram todos outorgados antes dos mega acidentes do Rio de Janeiro e do Paraná. Mas a realidade atual da empresa já não condiz com tais títulos.

Um grupo de ambientalistas movimenta-se, inclusive, para solicitar à International Organization for Standardization, ISO, a cassação do certificado ISO 14001 da Petrobrás. Com sede em Genebra, na Suíça, a ISO tem comitês técnicos que periodicamente verificam se as empresas certificadas continuam de acordo com os padrões de qualidade estabelecidos e os ambientalistas brasileiros pretendem acionar um destes comitês para rever a situação da Petrobrás após os dois acidentes.

Outra revisão necessária, e urgente, é a dos planos de contingência da empresa. Na Baía de Guanabara, a reação já não foi adequada: demorou demais e faltaram equipamentos. Em Araucária, no Paraná, repetiu-se a excessiva lentidão de resposta e os equipamentos, além de insuficientes, eram inadequados. Foram utilizadas barreiras de mar, quando as condições de dispersão do óleo num rio requerem barreiras específicas. E faltou treinamento adequado aos funcionários, nas condições reais dos ecossistemas do entorno da refinaria.

Conforme reza a cartilha da Federação Internacional dos Proprietários de Petroleiros para Controle da Poluição, ITOPF "uma das chaves da limpeza efetiva de derramamentos de óleo é boa organização e controle das operações. Diferenças potenciais de opinião devem ser resolvidas e conhecimentos e informações relevantes adquiridas antes de um evento ocorrer, na fase de planejamento da contingência". A ITOPF é especializada em derramamentos de óleo provocados por navios, em ambiente marinho, mas o conselho cai bem para a Petrobrás.

Quem sabe ouvindo seus pares com mais experiência em desastres, a lição seja melhor absorvida e a Petrobrás dispense uma nova "fatalidade" para se mover na direção de uma "excelência em gestão ambiental" de fato e não só virtual.

Petrobrás usa tecnologia de ponta para recolher óleo no Iguaçu

Quatro carretas carregadas com um produto adsorvente natural e mantas sintéticas já saíram do Rio de Janeiro e de São Paulo em direção a Curitiba

A Petrobras contratou as empresas Ecosorb e ERM para melhorar a contenção e recolhimento do óleo derramado nos rios Barigüi e Iguaçu, no Paraná. Quatro carretas carregadas com um produto adsorvente natural e mantas sintéticas já saíram do Rio de Janeiro e de São Paulo em direção a Curitiba e cogita-se a importação de mais produtos dos Estados Unidos e Canadá.

Os produtos são comercializados no Brasil pela Ecosorb, que colaborou voluntariamente no derramamento de óleo da Baía de Guanabara, em janeiro. Lá, utilizou 200kg do Sphag Sorb, no mangue e em limpezas realizadas por um mutirão de organizações não-governamentais (ONGs) na Ilha do Limão. Depois, contratada pela Petrobras, aplicou um total de 60 toneladas em outras áreas de mangue, praias e pedras da Ilha do Governador.

O Sphag Sorb é um líquen, que cresce na tundra canadense e tem a propriedade de adsorver e encapsular hidrocarbonetos. O produto se parece com pó de serra e tem capacidade de absorver petróleo em quantidades equivalentes a 6 vezes o seu volume, ao mesmo tempo em que repele a água. Uma vez aplicado, o produto é facilmente recolhido e disposto em aterros sanitários ou pode permanecer nos próprios locais atingidos. Os contaminantes encapsulados - sejam eles petróleo, gasolina, solventes, tintas ou substâncias químicas orgânicas - não são liberados pelo líquen, nem sob pressão. Sofrem, antes, um processo acelerado de biodegradação, deixando de ser uma ameaça ao meio ambiente. Depois de 8 meses a um ano, quando o óleo já foi todo biodegradado, o líquen também se degrada, sozinho. Por isso, o produto é ideal para áreas de preservação ou particularmente sensíveis.

"Além do produto natural, aqui no Paraná vamos utilizar também as mantas sintéticas, de polipropileno, que podem ser aplicadas diretamente sobre as águas, o que não foi possível na Baía de Guanabara por causa das ondas", explica Pedro Maziero, da Ecosorb. As mantas sintéticas absorvem o óleo e também repelem a água, mas estas precisam ser recolhidas e devidamente tratadas, ao contrário dos produtos naturais.

"Ainda colocamos à disposição da Petrobrás 20 caminhões de sucção de óleo, que estão vindo para o Paraná", acrescenta Maziero. Quarenta técnicos da empresa farão um treinamento de emergência para coordenar os trabalhos de contenção e recolhimento do óleo com a ERM, outra empresa contratada em São Paulo.

Contato com óleo traz morte dolorida aos animais terrestres

Peixes endêmicos podem sofrer perdas significativas e demorar muito tempo para recompor sua população

O contato direto com a mancha de óleo provocada pelo vazamento da Petrobras, no rio Iguaçu, no Paraná, é o maior perigo para a população ribeirinha da região, assim como para os técnicos e voluntários que trabalham no salvamento dos animais. Segundo o professor de toxicologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp/Botucatu), Igor Vassilieff, o óleo impermeabiliza os poros da pele, dificultando a transpiração. Além disso, a presença de hidrocarbonetos aromáticos, como o benzeno, faz com seja cancerígeno.

O especialista diz que muitos dos animais atingidos pelo óleo, mesmo que tenham atendimento, podem vir a morrer. "Essas substâncias provocam ardência em contato com o sol e provocam uma morte com muito sofrimento aos animais", informa.

Peixes endêmicos

Para os peixes, o perigo também é muito grande. "O contato direto com a massa de óleo provoca colapso respiratório e mata os peixes, assim como se houver problemas de anóxia (falta de oxigênio na água)", diz Julio Cesar Garavello, professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de São Carlos, autor de estudo sobre os peixes do rio Iguaçu.

"Os peixes dessa bacia estão isolados da bacia do Paraná por causa das Cataratas do Iguaçu, por isso muitas das 35 espécies presentes são endêmicas, ou seja, são exclusivas do rio Iguaçu, como grande parte dos lambaris, bagres, mandis e ossorubins", diz Garavello.

Segundo o biólogo, o fato de estarmos no inverno e não ser época de reprodução faz com que haja pouca movimentação de peixes, ou seja, poucos espécimes na região atingida. Além disso, a tendência dos peixes é fugir da poluição, o que favorece sua sobrevivência. "O problema é que na fuga, os peixes tendem a subir o rio. Se isso estiver acontecendo, a mortandade será inevitável", avalia.

Para Garavello, a recuperação de um rio com tantas espécies endêmicas é muito difícil, pois demora muito para ser repovoado. "O repovoamento com espécies de outras bacias não é recomendado nesses casos", informa.

Um acidente dessa magnitude - o maior em rio já ocorrido no Brasil - não tem conseqüências só no momento. "Os efeitos a longo prazo são o maior impacto, pois o rio perde sua função ecológica e, mesmo depois de muitos gastos com recuperação, nunca volta a ser como antes", diz José Galízia Tundisi, presidente do Instituto Internacional de Ecologia e especialista em recursos hídricos.

Para Tundisi, o Brasil não tem uma política de valoração dos ecossistemas. "Só avaliando economicamente os ecossistemas poderemos saber o quanto se está perdendo a cada vez que um acidente ecológico acontecer", diz.

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