Neutrinos podem mudar de forma e ter massa

Observação experimental contraria Modelo Padrão da Física de Partículas

Fonte - Ciência Hoje

Estamos cercados por elementos que mal conhecemos: diariamente, trilhões de neutrinos deixam o Sol e atingem nosso planeta. Em apenas um segundo, uma pessoa é atravessada por 150 milhões dessas partículas geradas na Terra. Cerca de 20 milhões delas são emitidas pelo corpo humano em uma hora. No entanto, por interagir fracamente com a matéria e não ter carga elétrica, os neutrinos são difíceis de ser observados.

Para acentuar as incógnitas que envolvem o tema, resultados experimentais obtidos por físicos do Observatório Sudbury de Neutrinos (SNO), no Canadá, indicam que essas partículas mudam de forma e que podem ter massa, ao contrário do que acreditam alguns cientistas. A descoberta foi anunciada em junho de 2001 e foi submetida para publicação na revista Physical Review Letters.

O neutrino é um dos elementos do chamado Modelo Padrão da Física de Partículas, que pretende definir os 'blocos' fundamentais que constituem a matéria. Como partícula elementar, o neutrino tem spin -- grandeza física que caracteriza uma propriedade análoga à rotação. "Até hoje, só foram identificados neutrinos com spin apontando na direção inversa do movimento", conta o físico Leandro de Paula, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Para explicar o fenômeno, os cientistas supõem que sua massa é nula."

Há três tipos de neutrinos: o neutrino do elétron, do múon e do tau. Reações nucleares no centro do Sol produzem neutrinos do elétron que são lançados sobre a Terra. O fato intrigante era que a quantidade desses neutrinos gerados pelo Sol parecia bem superior ao número de partículas que efetivamente alcançavam o planeta.

Para resolver o dilema, os pesquisadores do SNO instalaram um detector de neutrinos cerca de dois quilômetros abaixo do nível do mar, protegido contra interferências (veja ao lado). O aparelho é composto por um grande tanque contendo água pesada, com cujas moléculas os neutrinos raramente colidem. Nesse caso, há emissão de luz, e o instrumento detecta o tipo de neutrino que provocou o choque.

A análise das colisões mostra que o neutrino do elétron não é o único a atingir a Terra. O Sol produz apenas esse tipo de neutrino; o fato de outras espécies chegarem ao planeta indica que essas partículas mudam de forma durante o percurso. Como apenas elementos que têm massa fazem isso, a equipe do SNO concluiu que neutrinos têm massa, ainda que muito reduzida. 

"Estudos no Japão já haviam sugerido que neutrinos do múon oscilavam de forma", comenta Leandro de Paula.

A descoberta contraria o Modelo Padrão, e pode exigir sua revisão. Dados experimentais indicam que o universo está se expandindo. "Cálculos mostram que há muito mais massa no universo do que conseguimos observar com aparelhos", afirma de Paula. Acredita-se que há uma matéria escura no universo -- substância com massa e ainda não detectada. "Se o neutrino tiver massa, ele é candidato a constituinte dessa matéria."

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