Qual é a da erva ?

Estudo recente questiona a eficácia do antidepressivo natural conhecido como erva de São João

fonte - CNN - 7 de maio, 2001

Frederic Golden

De um amarelo vivo e formato de estrela, o fruto do arbusto perene Hypericum perforatum produz, quando esmagado, uma seiva vermelha que lembrava ao europeu da Idade Média o sangue de São João Batista. Celebrada por miraculosos poderes medicinais, a erva de São João (popularmente conhecida em português como milfurada) é usada desde a Grécia antiga para o tratamento de males hepáticos e intestinais. E ainda para a histeria, obesidade e insônia.

A erva só atingiu o estrelato, porém, em 1984, quando as autoridades sanitárias na Alemanha, de posse de estudos in vitro, colocaram a planta na lista dos chamados inibidores de MAO e autorizaram sua administração como antidepressivo natural de efeito moderado. A procura disparou tanto na Alemanha, onde a erva de São João bate fácil medicamentos controlados como o Prozac, como nos Estados Unidos, país em que os extratos da planta viraram pilares de uma efervescente indústria de medicina alternativa.

Até o ano passado, quando veio à tona o aviso de que a erva seria capaz de alterar o efeito de certos remédios — sobretudo os usados nos tratamentos da aids e de cardiopatias, além de antibióticos e anticoncepcionais administrados por via oral—, a venda anual do produto tinha chegado a US$ 310 milhões. Hoje, perto de 1,5 milhão de norte-americanos usam regularmente o extrato na tentativa de combater o sofrimento da alma.

Mas essa turma talvez precise agora encontrar algo diferente para animar o espírito, já que há uma suspeita de que a flor tenha perdido o notório viço. Na semana passada, uma equipe médica concluiu que o extrato é praticamente nulo no combate à depressão crônica. Até hoje, é de longe o estudo mais decisivo sobre a eficácia da milfurada.

Com base nas conclusões, publicadas no Journal of the American Medical Association, Richard Shelton, psiquiatra da Universidade Vanderbilt e principal autor do estudo, foi taxativo ao dizer que não indicaria a erva de São João a nenhum de seus pacientes. Shelton engrossa o coro dos especialistas para quem os cerca de 30 estudos que até agora atribuíam à planta um certo valor terapêutico foram mal-projetados, eram inadequados ou, simplesmente, estavam cheios de furos.

Num momento em que as autoridades norte-americanas estariam prestes a controlar com mais rigor os chamados suplementos alimentares, a divulgação do estudo toca num ponto nevrálgico da ala que vê na medicina herbácea uma via mais natural e menos invasiva para a cura. O American Botanical Council, organização sem fins lucrativos, apressou-se em responder às notícias e circulou na imprensa um comunicado cáustico no qual tachava a pesquisa de ambígua.

E o Council for Responsible Nutrition, que representa a indústria de vitaminas, disse que nada na pesquisa indicava que a erva de São João não surtirira efeito em casos de depressão leve ou moderada. John Cordaro, presidente do grupo, argumenta: "Uma pastilha pode ser ineficaz contra uma infecção na garganta e ideal para a simples dor de garganta".

Shelton, porém, não arreda o pé. A idéia da investigação surgiu quando começou a receber uma enxurrada de pacientes com depressão crônica que havia tentado, em vão, a cura via erva de São João. Ao descobrir que colegas da psiquiatria vinham registrando um fluxo semelhante de pacientes, Shelton recrutou médicos em cerca de uma dúzia de centros clínicos para testar, a seu lado, a eficácia da erva no combate à depressão.

Com a generosa ajuda financeira da Pfizer, fabricante tanto do antidepressivo Zoloft quanto de um extrato da milfurada, a equipe recrutou 200 voluntários. Do grupo, quase dois terços eram mulheres na faixa dos 40. Todos lutavam há pelo menos quatro semanas contra uma forte depressão. Para alguns, era difícil sair da cama ou cuidar dos filhos.

Divididos em dois grupos, e sem saber a qual pertenciam, os pacientes foram tratados com a erva ou com uma pílula inócua. A dose inicial? Três comprimidos de 300 miligramas por dia, dosagem que subiu para quatro pílulas depois de quatro semanas quando o quadro não melhorou. Embora a turma que tomou a milfurada tenha progredido ligeiramente comparada à do placebo (27 por cento contra 19 por cento), ao final das oito semanas do estudo a equipe médica considerou estatisticamente insignificante a diferença. No caso de antidepressivos convencionais, a recuperação costuma acontecer com dois terços dos pacientes.

Shelton e companhia admitem que o assunto está longe de encerrado. Tal final, porém, pode chegar ainda este ano, quando a agência federal norte-americana National Institutes of Health concluir um estudo de três anos. Mais abrangente, não terá uma das falhas atribuídas ao da Universidade Vanderbilt. Em vez de dividir simplesmente os pacientes em dois grupos — um para a erva de São João, outro para a pílula de farinha —, o estudo contará com uma terceira turma, a do antidepressivo com receita médica. Até lá, qual a saída para quem toma ou pensa em tomar a erva de São João? "Aguardar", diz Shelton, e considerar o uso de um dos mais de 20 antidepressivos no mercado, de eficácia clinicamente comprovada.

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