Original em:
Isto é
01 de maio de 1996
Saiu pela culatra o tiro da Petrobrás para substituir o álcool anidro,
de origem vegetal, pelo polêmico MTBE (metil tercil butil éter), de
origem petroquímica. Ambos, aditivos utilizados para oxigenar e melhorar
a performance da gasolina no motor de veículos. A Medida Provisória nº
1.409, assinada pelo governo na quarta-feira 17, que autorizou a troca dos
aditivos "em caráter de excepcionalidade" nos meses de abril e
maio, serviu para rebelar os prefeitos de cidades com menos de dois
milhões de habitantes, que receberiam a nova mistura, e, ainda, levantar
suspeitas de que a Petrobrás tentava, com a medida, riscar do mercado os
produtores de álcool anidro. Ao mesmo tempo que a MP entrava em vigor, a
estatal anunciava a construção de seis fábricas de MTBE, das quais
três – no Vale do Paraíba e Paulínia, no interior de São Paulo, e em
Duque de Caxias, na Baixada Fluminense – serão finalizadas ainda neste
ano. "Existem pesquisas há 15 anos sobre o MTBE, mas até agora
ninguém provou que esse combustível é prejudicial à saúde",
defende Joel Rennó, presidente da Petrobrás.
Trata-se de uma opinião minoritária. Segundo a Companhia de Tecnologia e
Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), o MTBE ainda é
pouco estudado, principalmente no que diz respeito aos seus efeitos
crônicos em exposição continuada. "O que se sabe sobre o MTBE são
os efeitos agudos que o combustível causa no homem: dores de cabeça,
náuseas e tonturas", afirma Alfred Szwarc, diretor da Cetesb. E
mais: segundo ele, relatórios da agência ambiental dos Estados Unidos
revelaram, a partir de testes de laboratórios, o desenvolvimento de
tumores malignos em animais expostos ao MTBE. Em 1991, a pedido da
própria Petrobrás, a Cetesb pesquisou a emissão de poluentes em
diversos combustíveis e emitiu relatório informando que o MTBE resulta
em um aumento de pelo menos 100% na emissão de monóxido de carbono, se
comparado ao álcool anidro.
A ameaça à saúde pública e a falta de preocupação da Petrobrás e do
governo em fazer um Relatório de Impacto Ambiental para medir as
consequências do MTBE no meio ambiente fizeram com que prefeitos de
dezenas de cidades dos Estados de São Paulo e do Paraná se rebelassem. O
prefeito de Curitiba, Rafael Greca, foi o primeiro a dizer não ao MTBE.
Na segunda-feira 22, Greca assinou um decreto proibindo a distribuição e
comercialização de gasolina com MTBE em Curitiba. "Sou prefeito da
capital ecológica do País e não vou permitir a utilização deste
aditivo em minha cidade", anunciou. No dia seguinte, ele conseguiu a
adesão do governador do Estado, Jaime Lerner, que também proibiu a
distribuição e a venda do aditivo em todo o Estado. "Que política
de espírito de porco é esta que quer envenenar o que está são?",
critica Greca. "O Paraná tem álcool anidro suficiente para
abastecer todo o Estado." A grita não foi em vão. Na quinta-feira
25, depois de convencer o ministro das Minas e Energia, Raimundo Brito, de
que o Paraná tinha álcool suficiente para abastecer os postos do Estado,
Greca deixou Brasília com a garantia do governo de que o MTBE não
entraria no Paraná. "Curitiba marcou mais uma vez o País com seu
sinal de luz", comemorou o prefeito. "Foi um vitória do meio
ambiente."
Prefeitos de cidades como Ribeirão Preto, Araraquara, Piracicaba e
Campinas também se posicionaram contra a comercialização da gasolina
com MTBE. "Campinas não pode ser exposta a um problema de saúde
pública por causa de um problema econômico da Petrobrás", avaliou
o prefeito da cidade, Edivaldo Orsi. "Se houve o interesse em
produzir o MTBE em alta escala, este interesse já foi por água
abaixo", completou, em referência a uma possível estratégia da
Petrobrás para desestabilizar o Proálcool. "Nunca houve segundas
intenções. Havia um déficit de álcool no ano passado. Eu tinha que
garantir o abastecimento", defende-se o ministro Brito. Campinas foi
uma das primeiras cidades a receber a gasolina com MTBE, cerca de cinco
milhões de litros. Ali, durante toda a semana a Secretaria de Saúde e o
Sindicato de Frentistas de Postos de Abastecimento registraram mais de 40
casos de frentistas intoxicados pelo aditivo. "Os sintomas variam
entre vômitos e dores de cabeça diz o prefeito. À exceção do Paraná,
até a última semana a MP do MTBE continuava em vigor em todo o País.
Colaboração:
Edgar
Roberto L. Pereira - Curitiba
- PR |