A ciência do medo e da dor

Fonte - cienciahoje

O sentimento de medo ajuda os homens e os animais a identificar ameaças à sua integridade e reagir a elas, mas o medo sem motivo ou excessivo pode se tornar um sério transtorno. Estudos feitos nas duas últimas décadas -- sobre as estruturas e processos cerebrais envolvidos nas respostas do organismo ao medo e à dor -- vêm possibilitando não só um conhecimento mais detalhado de como o cérebro deflagra e regula esses sentimentos, mas ainda revelam como e por que as psicoterapias são capazes de reduzir os sintomas de distúrbios como fobias, ansiedade e pânico.

Imagine-se em um campo de batalha. O perigo constante faz com que o 

coração dispare, as mãos suem, a respiração fique ofegante e a pressão arterial aumente. Sem que você perceba, seu fluxo sangüíneo é redistribuído da pele e das vísceras para os músculos e o cérebro. As sobrancelhas contraem-se, as pupilas dilatam-se e os olhos arregalam-se. A consciência de um ataque iminente do inimigo mantém toda a sua atenção nas mínimas alterações no ambiente, deixando-o pronto para uma eventual resposta de luta ou fuga. Esse é o sentimento de medo.

Os sentimentos de medo e dor envolvem experiências subjetivas dificilmente expressas de forma verbal. Esses sentimentos, sua origem e uma série de reações fisiológicas associadas a eles vêm sendo investigados por um verdadeiro exército de pesquisadores das áreas de psicologia e neurobiologia. Entre as descobertas mais importantes destaca-se a identificação de circuitos cerebrais específicos para os vários componentes ligados ao medo e à dor. Tais circuitos participam do processamento e da identificação dos estímulos ambientais de perigo, da organização e expressão de reações fisiológicas e comportamentos (respostas imediatas àqueles estímulos), bem como da consciência da experiência emocional.

Como todos os órgãos e tecidos do corpo, o cérebro é formado por células. Entre elas estão os neurônios, que formam o sistema de processamento e transmissão de informações. O cérebro humano tem entre 50 e 100 bilhões dessas células, capazes de se comunicar por um processo extremamente dinâmico: a sinapse (ver 'As ciências do cérebro', edição especial, em CH nº 94). Cada neurônio forma entre mil e 10 mil sinapses. Em apenas 1 mm3 de tecido do córtex cerebral humano existem cerca de 100 mil neurônios, formando algo em torno de 1 bilhão de sinapses. Assim, existem mais sinapses em um cérebro humano do que estrelas na Via Láctea.

Trata-se de uma verdadeira 'orquestra sináptica', que origina todos os processos comportamentais ou psicológicos -- dos mais simples, como perceber uma luz ou um som, até os mais complexos, como reagir a um estímulo e expressar uma emoção. A finalidade desse conjunto de reações, que expressamos desde os primeiros anos de vida, é provocar padrões comportamentais de fuga ou luta diante de estímulos ambientais sinalizadores de perigo. Outras espécies animais compartilham essa habilidade, embora não se possa assegurar que tenham a consciência subjetiva da experiência emocional de medo.

Ciência Hoje 174, agosto 2001
Antonio Pedro de Mello Cruz,
Instituto de Psicologia,
Universidade de Brasília;
J. Landeira-Fernandez,
Departamento de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,
Departamento de Psicologia, Universidade Estácio de Sá.

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