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Notícia de 30 de setembro de 2001

É preciso criar uma nova "teoria do choque"

Matéria enviada por Marina - Expoente

Campinas - A notícia de que as duas torres do World Trade Center, de Nova York, eram inteiramente revestidas de amianto soa como uma bomba de efeito retardado sobre uma catástrofe, que já era sem dimensões e não precisava de mais este agravante. Divulgada, aqui no Brasil, pela especialista Fernanda Giannasi, em reportagem de Maura Campanili, da Agência Estado, a notícia pode parecer só um detalhe, em meio ao caos de escombros e vidas perdidas. Mas é um novo choque, para quem conhece um pouco melhor os efeitos tóxicos do amianto e arrisca-se a calcular o impacto de 110 andares transformados em poeira e ainda multiplicados por dois.

O amianto, ou asbestos, é um mineral constituído de fibras microscópicas de elevada resistência, que tem numerosos usos industriais e aplicações únicas na construção civil. Sua alta resistência mecânica se compara à do aço. Resiste à combustão, a diversos produtos químicos e à acidez. Tem capacidade de filtrar microorganismos e outras substâncias nocivas. Promove isolamento elétrico e acústico. É durável, flexível, tem afinidade com cimentos, resinas e isolantes plásticos e facilidade para ser tecido ou fiado.

Todas estas propriedades positivas multiplicaram seu emprego em produtos industriais - de freios de automóveis a caixas d´água - até o final dos anos 80, quando algumas doenças pulmonares ocupacionais foram comprovadamente vinculadas ao contato com o mineral. Câncer de pulmão e asbestose são as duas doenças mais freqüentes, que afetam principalmente os trabalhadores de minas de amianto, de indústrias que o utilizam em seus produtos e, mais recentemente, também os funcionários de empresas especializadas em retirar o amianto de paredes e pisos, depois da proibição de seu uso, em diversos países industrializados.

As doenças são causadas pela inalação da fina poeira, resultante da quebra do amianto. As fibras microscópicas entram nos pulmões acumulando-se em suas paredes até torná-las rígidas e impermeáveis ao ar, interrompendo a função respiratória. Trata-se da mesma fina poeira, que permeia a nuvem permanente de fumaça, sobre os ares de Manhattan, desde a manhã do último dia 11.

Como é realmente muito fina, e, portanto, leve, esta poeira vai demorar para baixar. Muito mais do que a poeira de concreto e a fumaça. Provavelmente levará semanas até que o ar nova iorquino esteja novamente respirável. E, até lá, todas as pessoas que moram ou estão temporariamente retidas em Manhattan - e não apenas os bombeiros e voluntários de resgate - deveriam estar usando máscaras específicas contra o amianto, 24 horas por dia, ou, pelo menos, sempre que saírem à rua. Sobretudo porque as doenças associadas ao amianto podem se manifestar até mesmo muitos anos depois da vítimas se expor ao mineral em suspensão.

Quando passar o estado de emergência e calamidade pública, os efeitos desta contaminação "colateral" devem ser ponderados por ambientalistas, arquitetos, engenheiros e médicos. O colapso das torres gêmeas sugere a necessidade de uma versão ambiental da "teoria do choque", velha conhecida de quem faz cálculos estruturais.

Reza tal teoria, que um poste, uma coluna de sustentação, um viaduto ou qualquer outra obra de engenharia, deve ter sua estrutura superdimensionada, projetada para agüentar um impacto muito maior do que o razoável. Porque, se um dia, um carro bater no poste, um ônibus invadir o anexo do Palácio do Planalto ou um caminhão maior do que o vão tentar passar por baixo do viaduto, a estrutura terá de resistir.

Na versão ambiental da "teoria do choque" dos engenheiros, será preciso calcular os efeitos da escolha de cada material, utilizado nas construções, e, ainda, os efeitos da combinação de todos os materiais escolhidos, em caso de incêndio, de explosão, de colapso, de terremoto, de enchente e outros desastres. Só assim será possível superdimensionar a segurança, reduzindo a contaminação ao mínimo.

Existem milhares de novos materiais em uso na construção civil, cheios de características positivas, enaltecidas por seus criadores e, sobretudo, por seus patenteadores e fabricantes. Mas é preciso testá-los também sob a ótica de uma "teoria do choque" ambiental, para saber se resistirão diante do improvável ou se, ao contrário, potencializarão as conseqüências nefastas de eventuais desastres, como o amianto do World Trade Center.