É preciso
criar uma nova "teoria do choque"
Matéria enviada por Marina - Expoente
Campinas - A
notícia de que as duas torres do World Trade Center, de Nova York, eram
inteiramente revestidas de amianto soa como uma bomba de efeito retardado
sobre uma catástrofe, que já era sem dimensões e não precisava de mais
este agravante. Divulgada, aqui no Brasil, pela especialista Fernanda
Giannasi, em reportagem de Maura Campanili, da Agência Estado, a notícia
pode parecer só um detalhe, em meio ao caos de escombros e vidas perdidas.
Mas é um novo choque, para quem conhece um pouco melhor os efeitos tóxicos
do amianto e arrisca-se a calcular o impacto de 110 andares transformados em
poeira e ainda multiplicados por dois.
O amianto, ou asbestos, é um mineral constituído de fibras microscópicas
de elevada resistência, que tem numerosos usos industriais e aplicações
únicas na construção civil. Sua alta resistência mecânica se compara à
do aço. Resiste à combustão, a diversos produtos químicos e à acidez.
Tem capacidade de filtrar microorganismos e outras substâncias nocivas.
Promove isolamento elétrico e acústico. É durável, flexível, tem
afinidade com cimentos, resinas e isolantes plásticos e facilidade para ser
tecido ou fiado.
Todas estas propriedades positivas multiplicaram seu emprego em produtos
industriais - de freios de automóveis a caixas d´água - até o final dos
anos 80, quando algumas doenças pulmonares ocupacionais foram
comprovadamente vinculadas ao contato com o mineral. Câncer de pulmão e
asbestose são as duas doenças mais freqüentes, que afetam principalmente
os trabalhadores de minas de amianto, de indústrias que o utilizam em seus
produtos e, mais recentemente, também os funcionários de empresas
especializadas em retirar o amianto de paredes e pisos, depois da proibição
de seu uso, em diversos países industrializados.
As doenças são causadas pela inalação da fina poeira, resultante da
quebra do amianto. As fibras microscópicas entram nos pulmões
acumulando-se em suas paredes até torná-las rígidas e impermeáveis ao
ar, interrompendo a função respiratória. Trata-se da mesma fina poeira,
que permeia a nuvem permanente de fumaça, sobre os ares de Manhattan, desde
a manhã do último dia 11.
Como é realmente muito fina, e, portanto, leve, esta poeira vai demorar
para baixar. Muito mais do que a poeira de concreto e a fumaça.
Provavelmente levará semanas até que o ar nova iorquino esteja novamente
respirável. E, até lá, todas as pessoas que moram ou estão
temporariamente retidas em Manhattan - e não apenas os bombeiros e voluntários
de resgate - deveriam estar usando máscaras específicas contra o amianto,
24 horas por dia, ou, pelo menos, sempre que saírem à rua. Sobretudo
porque as doenças associadas ao amianto podem se manifestar até mesmo
muitos anos depois da vítimas se expor ao mineral em suspensão.
Quando passar o estado de emergência e calamidade pública, os efeitos
desta contaminação "colateral" devem ser ponderados por
ambientalistas, arquitetos, engenheiros e médicos. O colapso das torres gêmeas
sugere a necessidade de uma versão ambiental da "teoria do
choque", velha conhecida de quem faz cálculos estruturais.
Reza tal teoria, que um poste, uma coluna de sustentação, um viaduto ou
qualquer outra obra de engenharia, deve ter sua estrutura superdimensionada,
projetada para agüentar um impacto muito maior do que o razoável. Porque,
se um dia, um carro bater no poste, um ônibus invadir o anexo do Palácio
do Planalto ou um caminhão maior do que o vão tentar passar por baixo do
viaduto, a estrutura terá de resistir.
Na versão ambiental da "teoria do choque" dos engenheiros, será
preciso calcular os efeitos da escolha de cada material, utilizado nas
construções, e, ainda, os efeitos da combinação de todos os materiais
escolhidos, em caso de incêndio, de explosão, de colapso, de terremoto, de
enchente e outros desastres. Só assim será possível superdimensionar a
segurança, reduzindo a contaminação ao mínimo.
Existem milhares de novos materiais em uso na construção civil, cheios
de características positivas, enaltecidas por seus criadores e, sobretudo,
por seus patenteadores e fabricantes. Mas é preciso testá-los também sob
a ótica de uma "teoria do choque" ambiental, para saber se
resistirão diante do improvável ou se, ao contrário, potencializarão as
conseqüências nefastas de eventuais desastres, como o amianto do World
Trade Center.
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